1/13/2008


PARTE III

Como seria?
Como seria o mundo?
... Se um pintor frustado não se tornasse o líder do partido nazista? Se ele não tivesse chegado ao poder e espalhado a sombra do terror sobre toda a Europa?
Como seria?
...Se um homem chamado Colombo não tivesse imaginado que a Terra era redonda? Se ele não tivesse convencido a Rainha de Castela a financiar sua aventura?
... Se o filho de um carpinteiro não começasse a falar a respeito de suas idéias? Se ele não tivesse contaminado milhões e milhões de pessoas com a sua utopia de um mundo melhor?
Como seria?
Como seria o mundo se Perry Rhodan não tivesse voltado da Lua? Se ele tivesse morrido por lá, incapaz de se comunicar com seu planeta natal?
Certamente o mundo seria diferente se qualquer uma dessas coisas tivesse acontecido. Certos eventos são tão improváveis que acabam provocando grandes modificações na história da humanidade.
Era isso que estávamos discutindo naquele momento, naquela prisão fétida e repleta de ratos... como a história poderia ser diferente se a probabilidade dos eventos fosse alterada.
- Aquele monumento é uma espécie de portal das probabilidades. – disse Rhodan. Ele é capaz de identificar pequenos eventos que, modificados, mudam toda a história.
- É isso que deve Ter acontecido com o povo daquele planeta em ruínas. – ponderou Bell. O portal modificou a probabilidade dos eventos...
- ... e acabou com toda a vida no planeta. – conclui.
Bell começou a andar de um lado para o outro no pequeno espaço.
- Por quê? Qual a função dessa máquina, se é que é uma máquina... E como as pessoas do planeta a construíram e acabaram sendo mortos por ela?
- Você não tem nada na cabeça mesmo, hein gorducho? – chilreou Gucky. O portal foi achado. Ele é muito mais velho que a civilização das ruínas. Deve ter sido um achado arqueológico. Por isso o colocaram em um museu...
Bell ficou vermelho.
- Ah é, espertinho? Se é tão inteligente assim, por que não faz alguma coisa? Por que não dá alguns saltos até a nave e pede ajuda?
Rhodan balançou a cabeça.
- Você não entende, Bell? A nave não existe mais. Os humanos nunca conquistaram o espaço. Todo mundo que conhecemos não existe mais.
Bell sentou-se, abalado com a revelação.
- O que vamos fazer? – balbuciou.
- Antes de mais nada precisamos sair daqui. – disse Rhodan. Precisamos voltar ao Museu e tentar mudar as coisas. Gucky?
- O senhor é que manda, chefinho!
De repente algo estranho aconteceu. Os parafusos que prendiam as dobradiças das portas começaram a se mover, como se fossem manipulados por uma chave invisível. Depois de algum tempo todos estavam no chão e a porta desabou com um grande estrondo.
A multidão assustada olhou para nós quando assomamos à porta.
Um dos guardas se aproximou com uma metralhadora, mas a arma ganhou vida e resolveu fazer um passeio no teto do abrigo. O homem, como não quisesse soltá-la, acabou sendo levado junto e ficou lá, dependurado, as pernas balançando no ar.
- Quem mais quer voar? – perguntou Gucky, mostrando os dentes.
A multidão abriu espaço para nós.
Gucky foi na frente, marchando como um soldadinho de chumbo. Saímos do alojamento e atravessamos a rua. Em pouco tempo estávamos na frente do Museu.
- E agora, chefe? – indagou Gucky.
- Vamos entrar e examinar o portal. Deve haver algum mecanismo.
Rhodan deu dois passou e abriu a porta. Novamente pudemos ver o interior do edifício, totalmente conservado.
Segui Rhodan e o ajudei examinar o portal. Mas foi em vão. Não havia nada. Nenhum botão. Nenhum mecanismo.
Bell coçou a cabeça.
- Como faziam para esta coisa funcionar?
- Talvez controle remoto. – sugeri.
Rhodan balançou negativamente a cabeça.
- Nada disso. Deve haver algum mecanismo automático que liga essa coisa quando há gente por perto.
- Como o portal descobre que há pessoas por perto?
- Pensamento. – respondeu Rhodan. É assim que ele descobre os eventos que, uma vez alterados, podem mudar tudo.
Foi quando compreendi o que o administrador queria dizer.
- Se ele consegue captar pensamento, talvez consiga se comunicar dessa forma.
- Exatamente. Acho que temos serviço para você, Marshall. E para você também, Gucky.
Eu e o rato-castor nos aproximamos do portal e tentamos manter contato. Por instantes não senti nada. Era como tentar se comunicar com o chão, ou com o ar. Mas de repente toquei em algo. De um instante a outro, minha mente foi dominada por pensamentos estranhos. Vi o nascimento do universo sendo alterado. Vi uma civilização morrer por causa de um espelho. Vi um escritor cego ditando uma história. Vi seres diáfonos, em dedicada diversão. Vi naves espaciais explodindo no meio do vácuo. Novamente seres diáfonos carregando uma coisa. Uma lesma provocando uma guerra. Eu podia ver a coisa que eles carregavam. Era retangular e grande. Um parafuso se soltando de um avião e provocando sua queda. Os seres diáfonos carregavam o portal!
Acordei com uma insuportável dor de cabeça. Mas havia descoberto o significado do portal.
- É um brinquedo! – gritei. Um brinquedo de crianças! Os seres que a construíram a usavam para brincar com a realidade.
- Nós sabemos. – disse Rhodan. Gucky está em contato com a coisa.
Eu me levantei e, segurando a cabeça, vi o rato-castor. Ele parecia em transe e balbuciava palavras num tom de voz grave. O portal estava falando através de Gucky! Rhodan conversava com ele.
- Quem é você?
- Meus criadores não me deram um nome, apenas uma função.
- Qual é a sua função?
- Realizar brincadeiras com a realidade para ensinar às crianças a respeito da dependência sensível das condições iniciais dar-lhes responsabilidade. As crianças devem entender o caos, a entropia, os sistemas dinâmicos antes de aprender coisas realmente importantes.
- O que são as coisas realmente importantes?
- Não fui programado para ensinar sobre elas.
Rhodan coçou o queixo pensativo.
- O que são os sistemas dinâmicos?
- São sistemas que podem ser completamente modificados por pequenas alterações. Quase todo o universo é composto de sistemas dinâmicos: a conformação dos cinturões de asteróides, as montanhas do vale Iniii. Até mesmo um prato de refeição de nerons vivos é um sistema dinâmico. As crianças devem saber disso. Para isso eu existo.
- Você sabe que mudou toda a nossa realidade?
- Sim. Havia várias possibilidades. Uma delas era composta por um parafuso que, uma vez fora do lugar, provocaria uma guerra. Mas preferi uma que envolvia seres vivos para mostrar que a vida é caótica. É um sistema dinâmico. Um homem foi ao asteróide de seu planeta. Havia algo impedindo-o de voltar para casa. Ele resolveu investigar e achou uma tecnologia que mudaria completamente seu mudo. Se ele tivesse se acovardado, teria morrido ali, no asteróide, e seu mundo se consumiria nas chamas atômicas.
- Sabe quem é esse homem?
- Sim. Esse efeito borboleta chama-se Perry Rhodan.
- Sabe quem sou eu?
O portal pareceu tremer e iluminar-se. Depois de algum tempo respondeu, entre gaguejos.
- Você... é Perry Rhodan.
- Sim, e não estou morto. Sua brincadeira não é lógica, já que a alteração da realidade depende de minha morte. Você ensina a não-lógica às crianças?
- Eu ensino também a lógica paradoxal, mas o seu caso escapa à minha compreensão...
Perry Rhodan olhou para nós.
- Eu estava aqui, perto do portal, quando tudo aconteceu. Não fui afetado pela mudança da realidade.
- As crianças que estiverem brincando não devem ser afetadas.
- Mas a mudança dependia de minha morte. Esse é um erro que a programação desta coisa não pode compreender. Diga uma coisa: por que as crianças não poderiam ser afetadas?
- Isso poderia provocar alterações definitivas na realidade...
- Poderia haver uma realidade em que as coisas fossem completamente diferentes e até mesmo esta coisa deixaria de existir, então não haveria como voltar aos níveis normais de probabilidades dos eventos. É um item de segurança...
O portal voltou a tremer e iluminar-se.
- ... Mas como a alteração passou a ser feita a partir de minha morte, isso o coloca em uma situação insolúvel. Só há uma maneira de corrigir isso e impedir essa falha de segurança: você deve voltar a realidade ao normal.
A máquina voltou a pensar. Por fim disse:
- Está bem.
O portal começou a tremer e a emitir uma estranha luz. Em pouco tempo não pude ver mais nada. Tudo ficou escuro e, aparentemente, desmaiei. Quando acordei as coisas pareciam não ter se modificado. O prédio continuava exatamente como antes. Eu me levantei e percebi que Rhodan e Gucky já estavam em pé. Bell esfregava a cabeça e começava a se levantar.
- Vamos embora. – disse Rhodan.
Eu me surpreendi quando abrimos a porta: lá fora as coisas continuavam como estavam no começo. Nada de Washington. As ruínas eram as do planeta desconhecido.
Nós percorremos os escombros e encontramos a nave. Quando já estávamos decolando, Bell resmungou, enquanto ainda coçava a cabeça:
- Há uma coisa que ainda não entendi...
- O quê? – perguntou Rhodan.
- Se ele mudou a história, fazendo com que tivéssemos morrido, por que não morremos?
- Porque o portal é programado para não afetar as pessoas que o estão usando. Ele aparentemente era usado para mostrar as responsabilidades inerentes ao conhecimento. Eles mostravam para as crianças o que aconteceriam se elas não agissem com responsabilidade, mas não as afetava, para que tivessem oportunidade de consertar o erro cometido. Só que com o tempo, depois que a civilização que o criou foi extinta, ou talvez se mudou para o outro mundo, o portal passou a ser uma verdadeira armadilha. Só pudemos modificar a situação porque as pessoas que mudaram os eventos que ele controlava estavam ali e não foram afetadas...
- Continuo sem entender uma coisa...
- Diga, Bell...
- Como ele pôde nos confundir com crianças?
- Ora, você sempre será uma criança, gorducho... – disse Gucky.
Reginald Bell avançou para ele, pronto para esganá-lo.
- Ei, o que é isso, gorducho? Acho que depois de salvar todos nós, eu mereço algumas cócegas...
Rhodan concordou:
- Se não fosse Gucky, não teríamos como nos comunicar com o portal e acho que você não ia gostar de viver em um mundo em ruínas, governado com mãos de ferro por Alan D. Mercant.
Bell se sentou e começou a coçar a cabeça do rato-castor, não sem antes resmungar:
- Ainda vou ter uma conversa muito séria com Mercant...


FIM

OBS: Todos os direitos sobre o Universo PERRY RHODAN pertencem à VPM emRastatt, Alemanha. Este livro foi escrito por Gian Danton com o objetivo de divulgar a série e conquistar novos leitores.

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